Há um tempo pouco se ouvia sobre tutela de interesses ou direitos
coletivos, difusos e individuais homogêneos. Tão pouco, dos instrumentos
disponíveis em nosso ordenamento jurídico usados para esse fim.
Atualmente, a demanda de ações coletivas em nossos Tribunais vem
aumentando, quer seja por meio da substituição processual exercida pelos
Sindicatos em defesa dos direitos de classe, quer seja pela atuação do
Ministério Público ao tutelar interesses metaindividuais.
Este aumento advém das vantagens que proporciona o acesso coletivo à
justiça, destacando-se dentre elas a prevista no princípio da economia
processual, pois, custaria muito caro se, por exemplo, os membros de uma classe
de trabalhadores tivessem que ingressar individualmente à justiça para pleitear
direitos da mesma espécie.
Não obstante, é muito mais seguro para o magistrado julgar e decidir de
modo uniforme, não correndo o risco de proferir sentenças diferentes em
litígios de causa e pedido iguais.
Com isso, surge uma importante discussão acerca da prescrição, em
especial da prescrição trabalhista, pois, seria correto afirmar que o acesso coletivo
à justiça do trabalho interrompe a prescrição das pretensões individuais
trabalhistas?
Para responder a essa pergunta devemos trazer ao presente estudo a
finalidade da prescrição e sua importância para a pacificação das relações
sociais, como bem destaca o ilustre Homero Batista de Mateus da Silva que
leciona:
"Para muitos, a prescrição serve
apenas para perpetuar injustiças e premiar o mau pagador. Para outros, sua
instituição veio cobrir uma lacuna na busca pela pacificação das relações
sociais e estabilidade das relações jurídicas, impedindo que o interessado
represe uma demanda por anos a fio, na expectativa de vencer pelo cansaço.
Possibilita também, que as questões de maior complexidade, que provocam
insegurança simultaneamente em ambas as partes de um contrato de trabalho e até
mesmo nos operadores do direito, possam encontrar uma forma de sedimentação,
ainda que não a mais desejada". (SILVA, Homero
Batista de Mateus. Ações Coletivas Interrompem a prescrição das pretensões
individuais trabalhistas? In Ação Coletiva na visão de juízes e procuradores do
trabalho, LTR, São Paulo: 2006,
pág 219).
Posto isso, passaremos a tratar da interrupção da prescrição, prevista no
artigo 202 do Código Civil, a qual limita esta em uma única vez a cada demanda,
zera o prazo e faz começar nova contagem, quando o credor sai do estado de
inércia e lança suas pretensões à justiça, por meio de atos que coloquem o
devedor em estado de mora, delineados nos incisos I à VI do mesmo dispositivo.
Conquanto o inciso I do artigo 202 do Código Civil combinado com o
conceito de que somente o credor pode provocar a saída da inércia, levando a
uma conclusão oposta de que as ações coletivas não interrompem a prescrição, a
ação do sindicato como substituto processual, como dito anteriormente, atende
aos anseios por decisões céleres e uniformes, com custos processuais bem
menores para as partes e para os cofres públicos. A substituição processual,
nada mais é do que uma forma de busca da tutela jurisdicional, constituindo o
devedor em mora, portanto, é justo afirmar que interrompem a prescrição.
No caso da ação coletiva ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, os
fundamentos para a interrupção da prescrição são os mesmos para a ação do Sindicato,
mesmo sendo menor seu campo de atuação, visto que sua petição inicial terá
igual impacto perante o empregador, que deverá apresentar documentos e tomar
outras providências para o regular andamento do processo, até porque, o artigo
203 do mesmo dispositivo diz que a prescrição é interrompida por qualquer
interessado.
Cumpre mencionar também, sobre a ocorrência da interrupção da prescrição
em relação aos atos provocados pelos entes coletivos ou o Ministério Público do
Trabalho ao chamarem o devedor para formas extrajudiciais de solução dos
conflitos, tomando como fundamento o inciso VI do artigo 202.
No entanto, há entendimentos opostos, como podemos observar em decisão do
Tribunal Regional do Trabalho da 2ª
Região que concluiu que a ação civil pública não interrompe o prazo
prescricional, senão vejamos:
RECURSO ORDINÁRIO.
PRAZO PRESCRICIONAL NÃO INTERROMPIDO PELO AJUIZAMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. A
ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho não interrompe
o curso do prazo prescricional para o ajuizamento de ação trabalhista
individual, na medida em que aquela visa apenas a defesa de interesses difusos,
coletivos e individuais homogêneos, consoante dispõem as Leis 7347/85 e
8078/90. Aplica-se, outrossim, analogicamente, a orientação contida na Súmula
268 do C.TST, a qual dispõe que "a demanda trabalhista, ainda que
arquivada, interrompe a prescrição somente em relação aos pedidos
idênticos". Não há, pois, como se conceber que o ajuizamento de uma ação
civil pública, - em relação à qual sequer foi demonstrada pelo autor a
existência de algum pedido idêntico ao postulado na presente ação individual, -
tenha o condão de afastar a prescrição extintiva que se abateu sobre o seu
direito de ação. Cumpre ainda salientar que se tal identidade existisse
restaria configura a ocorrência de litispendência pois, conforme noticiou o
próprio recorrente, a referida ação civil pública encontra-se em trâmite.
Inviável, assim, o acolhimento da tese obreira de que houve interrupção do
curso do biênio prescricional. (SÃO PAULO.
Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Recurso Ordinário. 20060632113, 13. dez. 2007. In Tribunal
Regional do Trabalho da 2ª Região).
Nesse sentido, cumpre ressaltar ainda, que não poderia ocorrer a
interrupção da prescrição pela interposição de ação coletiva se esta for
prejudicial ao empregado, pois, imagine que um trabalhador, sem saber que foi
ajuizada uma ação coletiva por seu sindicato dois meses após sua demissão,
ajuíze uma ação trabalhista um ano após sua demissão e não compareça na
audiência dando causa ao arquivamento da mesma, venha ajuizar novamente uma
reclamação um ano e três meses após a primeira, seja surpreendido com a perda
de seu direito por desconhecer que a prescrição não foi interrompida com a
interposição de sua Reclamação, mas sim muito antes com o ajuizamento da ação
coletiva.
Mas, como mencionado no artigo 203 do Código Civil qualquer interessado
pode interromper a prescrição, portanto as questões previamente tratadas em
ações coletivas, atos extrajudiciais dos Sindicatos ou Ministério Público do
Trabalho interrompem o prazo prescricional das pretensões individuais
trabalhistas.
Nesse rumo, o ilustre Homero Batista de Mateus da Silva em sabia
explanação leciona:
"A interrupção pelos
processos coletivos se fundamenta tranquilamente no art. 202, I do Código Civil
Brasileiro de 2002, combinado com o art. 203 (qualquer interessado), ao passo
que a interrupção pelos procedimentos extrajudiciais encontra sua força no
art.202, VI desde que haja comportamento favorável por parte do devedor". (SILVA, Homero Batista de Mateus. Ações Coletivas
Interrompem a prescrição das pretensões individuais trabalhistas? In Ação
Coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, LTR, São Paulo: 2006, pág 219).
Diante do
exposto, podemos concluir pela afirmação de que as ações coletivas interrompem
a prescrição das pretensões individuais trabalhistas, amparado pelos já
mencionados artigos 202 e 203 do Código Civil, porém, desde que essa
interrupção não prejudique o trabalhador, como no exemplo acima descrito.